Revista de Arqueología Histórica Argentina y Latinoamericana
Vol. 14, Núm. 2, julio - diciembre 2020. ISSN 2344-9918
Asociación de Arqueólogos Profesionales de la República Argentina
Artículos

RESISTENCIA Y FE: MATERIALES SAGRADOS EN UN ALMACÉN DE PERSONAS ESCLAVIZADAS EN RIO DE JANEIRO, SIGLO XIX

RESISTANCE AND FAITH: SACRED MATERIALS IN AN ENSLAVED PEOPLE WAREHOUSE IN RIO DE JANEIRO, NINETEENTH CENTURY

RESISTÊNCIA E FÉ: MATERIAIS SAGRADOS EM UM ARMAZÉM DE PESSOAS ESCRAVIZADAS NO RIO DE JANEIRO, SÉCULO XIX

Anderson Marques Garcia
Professor do Departamento de Arqueologia da universidade do estado do Rio de Janeiro
Gina Faraco Bianchini
Doutora em Arqueologia pelo Museu Nacional, universidade Federal do Rio de Janeiro
Renata Nunes Alves
Licenciada em História universidade Federal do Rio de Janeiro
Riccardo Frigoli
Mestre em Pré-história pela universidad de salamanca
Deusimar de Lissá
Gayaku e presidente do Centro de estudos Afro-Religioso e Cultural Rumpaime Héviosô zôônokum Mean. Coordenadora do Coletivo de entidades Negras no Rio de Janeiro
Maria Dulce Gaspar
Professora do Programa de Pós-graduação em Arqueologia, Museu Nacional, universidade Federal do Rio de Janeiro
Cómo citar este artículo:
Marques Garcia, A., Faraco Bianchini, G., Nunes Alves, R., Frigoli, R., de Lissá, D., & Gaspar, M. D. (2021). Resistencia y fe: materiales sagrados en un almacén de personas esclavizadas en Rio de Janeiro, siglo XIX. Revista de Arqueología Histórica Argentina y Latinoamericana, 14(2), 31–64. Buenos Aires
RESUMEN:

El presente artículo es el resultado de una investigación realizada en el centro de la ciudad de Río de Janeiro que permitió discutir diferentes aspectos de un almacén especializado en la venta de personas esclavizadas, el Almacén M. Velludo & C., que operaba en la antigua calle de los Ourives entre las décadas de 1860 y 1870. A lo largo del texto, se discute la historia de este espacio; las relaciones estratigráficas de los restos arqueológicos; y las afinidades de estos materiales con elementos de cultos afrobrasileños. Palabras clave: diáspora, mercado de esclavos, control social, asentamientos afroreligiosos

Palabras clave:
diáspora, mercado de esclavos, control social, asentamientos afro-religiosos
ABSTRACT:

This article is the result of a research carried out in the center of the city of Rio de Janeiro that made it possible to discuss different aspects of a warehouse specialized in the sale of enslaved people, the M. Velludo & C. Warehouse, that operated in the old Ourives Street between the 1860s and 1870s. Throughout the text, is discussed the history of this space; the stratigraphic relationships of archaeological records; and the affinities of these materials with elements of Afro-brazilian cults. Key words: diaspora; slave market, social control, afro-religious settlements

Keywords:
diaspora; slave market, social control, afro-religious settlements
RESUMO:

O presente artigo é resultado de uma pesquisa realizada no centro da cidade do Rio de Janeiro que possibilitou discutir diferentes aspectos de um armazém especializado na venda de pessoas escravizadas, o Armazém M. Velludo & C., que funcionou na antiga Rua dos Ourives entre as décadas de 1860 e 1870. Ao longo do texto é discutido a história desse espaço; as relações estratigráficas dos remanescentes arqueológicos; e as afinidades desses materiais com elementos de cultos afro-brasileiros. Palavras-chave: diáspora, mercado de escravos, controle social, assentamentos afro-religiosos

Palavras-chave:
diáspora, mercado de escravos, controle social, assentamentos afro-religiosos
Recibido: junio de 2020
Aceptado: diciembre de 2020

INTRODUÇÃO

O artigo tem como objetivo apresentar a interpretação de um conjunto de remanescentes arqueológicos identificados no centro da cidade do Rio de Janeiro em 20181, relacionados ao endereço 221 da antiga Rua dos Ourives (Rua Miguel Couto). Durante a pesquisa em campo também foram identificados remanescentes de prédios vizinhos, contudo, o enfoque desse texto está voltado para o espaço em destaque, pois os remanescentes do mesmo apresentaram maior integridade e foram identificados registros históricos de que esse endereço foi utilizado como sede de um armazém de venda de pessoas escravizadas entre 1860 e 1874, o Armazém M. Velludo & C.

Lalouf, Santos e Buch (2008) explicam que os espaços utilizados para o comércio de seres humanos no continente americano foram díspares, havendo variações quanto aos tipos de construções e locais de implementação. Muitos desses espaços tiveram múltiplas funções, destacando-se as de assegurar o cumprimento de contratos e o controle de fugas; aplicações de medidas sanitárias; propiciar recuperações físicas pós viagem transatlântica; e a realização de contrabandos.

Até a primeira metade do século XIX a região central da cidade do Rio de Janeiro foi um ponto estratégico de receptação e venda de pessoas escravizadas vindas da África. Nesse contexto a Alfandega e o Cais do Valongo foram os principais locais de desembarque dos cativos recém-chegados, denominados pretos novos, e antiga Rua do Valongo (Rua Camerino) como a principal área de negociação do mercado de escravos (Andrade Lima, Sene e Souza, 2016; Honorato, 2008; Tavares, Rodrigues-Carvalho e Lessa, 2020). Todavia o contexto temporal do armazém pesquisado situa-se entre as décadas de 1860 e 1870, período entre a primeira década após a proibição definitiva do tráfico transatlântico de escravos no Brasil e a penúltima década de escravidão legalizada.

Em relação a estudos de Arqueologia afro-brasileira, Symanski (2014) frisa sobre a necessidade de pesquisas em contextos além de unidades rurais, apontando que nesses ambientes tem se avançado no entendimento de práticas cotidianas, padrões de vida material e de mecanismos de construção indenitária. Por isso, a investigação de outros contextos ocupados por africanos e seus descendentes, escravizados e livres, é essencial para se construir um entendimento mais amplo desse contingente populacional.

A partir de então houve investimento crescente voltado para a diáspora africana em contextos urbanos, podendo-se destacar no Rio de Janeiro estudos como o de Andrade Lima, Souza e Sene (2014) discutindo amuletos e modificações corporais enquanto componentes de pele social; de Andrade Lima et al. (2016) que trata da identificação do Cais do Valongo; de Andrade Lima (2016) voltado para a interação de pessoas escravizadas ao redor de um ponto de coleta de água; de Lessa, Tavares e Rodrigues-Carvalho (2018) que aborda o controle social em um cemitério de pretos novos; de Tavares et al. (2020) sobre distintos locais de desembarque de cativos africanos; e de Garcia et al. (2020) sobre o ofício de calceteiros entre os séculos XVIII e XIX.

Nessa oportunidade pretende-se, de mesmo modo, contribuir com a Arqueologia afro-brasileira e com a Arqueologia afro-latinoamericana, pois são escassas no continente edificações como a identificada que foram objetos de intervenção arqueológica (Bracco e Lopez Mazz, 2014). Esse artigo apresenta materiais que foram interpretados como componentes de assentamentos religiosos, que sugerem que pessoas escravizadas durante a segunda metade do século XIX teriam encontrado modos de interagir com seus ancestrais através de objetos, ainda que nas dependências de um armazém especializado na venda de pessoas.

HISTÓRICO DO PRÉDIO

Durante a urbanização inicial do centro da cidade do Rio de Janeiro a Rua Miguel Couto, junto a área de pesquisa, foi conhecida como Caminho da Conceição para o Parto, com algumas casas edificadas já desde a primeira década do século XVIII. A extremidade oposta dessa rua era conhecida como Caminho do Parto para a Conceição, trazendo em seus nomes o Morro da Conceição e a capela de Nossa Senhora do Parto (Gerson, 2013; Santos, 2013). A carta de Massé (1713) ilustra o Caminho da Conceição para o Parto com um quarteirão parcialmente completo junto à área onde mais tarde seria erguida a Igreja de Santa Rita2. Nas cartas anteriores esse espaço não aparece loteado, constando como um terreno repleto de áreas influenciadas por ação hídrica.

Por decreto, em 1742, foram concentrados nessa via os ourives e joalheiros da cidade, fazendo com que passasse a ser conhecida como Rua dos Ourives (Gerson, 2013; Santos, 2013). A partir da carta de Vaz (1750) as representações dessa rua ilustram um espaço densamente urbanizado. Todavia, as primeiras referências ao prédio 221, começam a figurar nos periódicos históricos somente a partir da década de 1820 (Diario do Rio de Janeiro, 1827). Nas décadas seguintes outras notícias ligadas a esse endereço surgem e começam a se destacar os anúncios de aluguel e venda de pessoas (Jornal do Commercio, 1838; 1848; 1857). A partir da década de 1860 a frequência de publicações aumenta e os anúncios comunicam a venda de pessoas em lotes, tornando evidente que o prédio 221 passou a funcionar como um espaço formal de compra e venda de pessoas escravizadas. Entre 1860 e 1874, há uma série de notícias sobre o comércio e fuga de pessoas relacionadas a esse endereço (Correio Mercantil, 1867b; Diario de Pernambuco, 1872; Haring, 1870; Jornal do Commercio, 1860; Jornal do Commercio, 1863b; Jornal do Commercio, 1874a).

Entre 1867 e 1874 as atividades de negociação de pessoas escravizadas estão relacionadas diretamente a José Moreira Velludo, proprietário da firma M. Velludo & C. sediada nesse endereço (Correio Mercantil, 1867a; Diario do Rio de Janeiro, 1870; Jornal do Commercio, 1874b; Laemmert, 1872). No mesmo período, José Antonio Garcia aparece como morador do prédio (Haring, 1864). Nos primeiros anos da década de 1860 o endereço do armazém relacionava-se a Antonio Thomaz Pereira Junior (Haring, 1861).

A sobreposição temporal deixa explícito o uso diferenciado dos espaços que compunham o prédio 221. Na década de 1860, o térreo estava ligado ao armazém de pessoas escravizadas e o pavimento superior a um espaço residencial. O mapa arquitetural de Fragoso (1874) ilustra o imóvel, sendo o térreo com uma janela na porção central da fachada e uma porta em cada lado, uma de acesso ao armazém e a outra, possivelmente, conectada a escada de ascensão ao sobrado, cuja fachada tinha três portas com sacadas. Na carta de Gotto (1871) pode-se ainda notar, ilustrado nos fundos do prédio, algo como uma escada de acesso ao andar superior.

Entre os anos de 1869 e 1870, José dos Santos Carrega figura como sócio de José Moreira Velludo em seu negócio de “...compra e venda de escravos” (Diario do Rio de Janeiro, 1870, p. 3). Entre 1870 e 1872 o endereço Rua dos Ourives 221 é mencionado no Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial do Rio de Janeiro como um dos “Escriptorios e Casas de Consignação de comprar e vender escravos” (Haring, 1870, p. 606; Laemmert, 1872, p. 663). Entre os anúncios destacam-se duas edições do Jornal do Commercio de 1863, que apresentam idades e algumas das profissões das pessoas a venda, e fazem referência ao antigo chafariz do Largo de Santa Rita para a localização do armazém, reproduzidos a seguir: “...Vende-se um lote de lindos moleques de 10 a 20 annos, pretas moças e officiaes de officio, vindos do norte3 no ultimo vapor, juntos ou separados, são todos sadios e sem defeito; na rua dos Ourives n. 221” (Jornal do Commercio, 1863a, p. 4).

Vendem-se 30 escravos, sendo pretas prendadas, officiaes de officio, bonitos moleques e pretos boas peças para serviço de lavoura ou outro qualquer, o primeiro é um perfeito carpinteiro, um padeiro, um pedreiro, duas pretas boas peças, o melhor que se pode desejar, sabendo engommar perfeitamente, uma parda boa peça, e mais tres escravos que servem para todo o serviço de casa; na rua dos Ourives n. 221, em frente ao chafariz do largo de Santa Rita (Jornal do Commercio, 1863b, p. 4).

Como manifestações de resistências aos horrores vividos pelas pessoas escravizadas durante o século XIX, encontra-se uma série de notícias sobre insurgências que ocorriam na cidade do Rio de Janeiro. Entre elas, ofertas de recompensas para a entrega de cativos fugidos da loja situada no número 221 da Rua dos Ourives e de fazendas do interior. O referido endereço é mencionado como local para encaminhamento dos capturados e recebimento de pagamento pelo serviço prestado (Haring, 1867; Jornal do Commercio, 1871a, 1871b, 1874a, 1874b). No ano de 1872 houve uma insurgência no prédio 221 que ganhou as páginas oitocentistas. Os periódicos Diario de Noticias (1872) e Diario de Pernambuco (1872) informam que no dia 30 de março, as 4 da tarde, houve uma tentativa de fuga em massa de 29 pessoas, que antes agrediram José Moreira Velludo e seu caixeiro Justo Gonçalves Pereira com pedaços de madeira. Nessa situação, o prédio foi cercado por fuzileiros navais e foram presos os considerados insurgentes que estavam consignados no Armazém M. Velludo & C.

O periódico O Movimento (1872) informa que os homens julgados culpados foram condenados a sofrer 100 açoites e a “trazer ferro ao pescoço” por seis meses. Entre as justificativas dos condenados destacase a de Bonifácio, o mais velho entre eles, que confessou envolvimento na insurreição, mas explicou seu ato em razão de frequentemente ser castigado além do que podia suportar. No dia 8 de julho de 1872 foram julgados sete dos presos, todos solteiros e não alfabetizados (Tabela 1).

Tabela 1: Relação dos dados pessoais e sentença dos acusados pela agressão a José Moreira Velludo (O Movimento,1872).
Tabela 1: Relação dos dados pessoais e sentença dos acusados pela agressão a José Moreira Velludo

Quanto a manifestações culturais, foram também frequentes ações estatais de controle dos cativos nesse período. Sem associação direta ao prédio 221, mas citando o primeiro distrito da Freguesia de Santa Rita, foram noticiadas no Correio Mercantil prisões em virtude da prática de “batuque”: “... Na de Santa Rita, 1° districto, - José Lopes de Faria Moreira, Januario Martins Vianna, João Gil, Claudina Rufina Garcia Rosa, Joaquim Martins, Francisca Maria da Conceição e Rosalina Francisca de Moraes, por assuada e batuque” (Correio Mercantil, 1862, p. 3). O ano de 1874 consta como o último de funcionamento do Armazém M. Velludo & C. Todavia, a Gazeta de Noticias apresenta posteriormente José Moreira Velludo como proprietário de outro armazém de pessoas, localizado no prédio 104 da antiga Rua da Prainha (Rua do Acre), com anúncios entre 1875 e 1878, entre eles a notícia de um outro conflito ocorrido em 1877 (Gazeta de Noticias, 1877; Jornal do Commercio, 1875; 1876; 1878). Entre 1879 e 1882 encontram-se as últimas notícias relacionadas ao negociante, destacando-o como sócio de Antonio Leite Ribeiro na empresa de comissões e consignações Leite Ribeiro & Velludo, endereçada na Rua Theóphilo Ottoni 75 (Cardoso, 1879; Sauer, 1882). Não se pode afirmar que nesse endereço existiu também um armazém especializado na venda de pessoas, porém anúncios esporádicos foram encontrados (Jornal do Commercio, 1879a; 1880). O local onde residiu José Moreira Velludo durante todos esses anos é incerto, mas em 1876 é mencionado como residente na Rua Visconde de Inhaúma (Diário do Rio de Janeiro, 1876). Com a saída de José Moreira Velludo e o fim do comercio de pessoas no prédio da Rua dos Ourives, ocorreram diferentes usos do imóvel ao longo das décadas seguintes, alguns apontados abaixo (Tabela 2).

Tabela 2. Usos do prédio 221 (175) entre as décadas de 1870 e 1900 (Gazeta de Noticias, 1879, 1886; Jornal do Brasil, 1904a; Jornal do Commercio, 1879b, 1891; Laemmert, 1875, 1876; Sauer, 1892).
Tabela 2. Usos do prédio 221 (175) entre as décadas de 1870 e 1900

A partir de Fragoso (1874) e Cavalcanti (1878) verifica-se que em 1874 ocorreram mudanças na numeração de imóveis da cidade do Rio de Janeiro, e o prédio 221 tornou-se 175 (Figura 1). Em virtude das reformas urbanas durante a gestão do prefeito Pereira Passos, o prédio 221/175 assim como o casario dessa porção da Rua dos Ourives foram derrubados em 1904, para a abertura da Avenida Marechal Floriano. As desapropriações foram autorizadas em 1896, o decreto sancionado em 1903 e a notícia de que o prédio seria adquirido pela prefeitura foi publicada no dia 29 de agosto de 1904 (Jornal do Brasil, 1904b; Santos, 2013).

Figura 1. Parte do casario da Rua dos Ourives ilustrada por Fragoso (1874). Destaque para o prédio 221, identificado como 175 conforme a nova numeração formalizada em Cavalcanti (1878).
Figura 1. Parte do casario da Rua dos Ourives ilustrada por Fragoso (1874)

METODOLOGIA DE PESQUISA DE CAMPO

O início da pesquisa arqueológica se deu com a monitoria da retirada mecânica das camadas superficiais de asfalto, concreto e dos remanescentes do ramal ferroviário relacionado aos bondes elétricos que circularam nessa via durante a primeira metade do século XX. Após a retirada dos entulhos foi iniciado o processo de decapagem com o objetivo de expor as superfícies dos remanescentes arquitetônicos. Para orientar a abertura de setores foi implantada uma malha alfanumérica de quadrículas de 1 x 1 m, permitindo o mapeamento das unidades de escavação e maior controle sobre a distribuição dos materiais móveis recuperados das 27 quadrículas abertas. Destaca-se que o sítio se encontra em uma área urbana, no centro do Rio de Janeiro, em uma das vias mais vivas e transitadas da capital fluminense, realidade que traz condicionantes à pesquisa, mas também estímulos próprios de centros urbanos. Um exemplo é o emaranhado de infraestruturas instaladas através de cortes executados nos estratos e remanescentes arquitetônicos ao longo do século XX. Como sugerem Harris (1991) e Carandini (2000), cada uma dessas ações pode ser entendida como unidade estratigráfica (UE), assim, todas as UEs do sítio receberam denominações em algarismos arábicos representadas entre colchetes. Estratégia que auxiliou no processo de individualização e na compreensão das inter-relações das intervenções identificadas, sejam elas históricas construtivas, cortes contemporâneos ou mesmo estratos naturais, através das leis da estratigrafia arqueológica.

Embora a malha alfanumérica comportasse todos os remanescentes arquitetônicos encontrados, só algumas quadrículas foram escavadas em profundidade para não exaurir o contexto arqueológico, uma vez que a cota máxima de implantação do empreendimento foi de 40 cm, inferior aos topos dos remanescentes identificados. Por esse motivo, os mesmos ficaram protegidos e preservados abaixo do pavimento. As quadrículas foram abertas com o objetivo de expor uma amostra dos remanescentes arquitetônicos identificados para investigar as características construtivas, dimensões e cronologias relativas através dos contatos entre UEs. No entanto, decidiuse verificar também a porção central do lote através de uma quadrícula, cuja escavação resultou na identificação de uma nova estrutura, com cota 20 cm mais profunda que as demais expostas por decapagem. Com isso, a quadrícula foi ampliada para uma área de 10 m² que revelou a presença de uma estrutura circular que será abordada adiante.

Ao longo da pesquisa em campo foram identificadas modificações do espaço que remontam às atividades ocorridas durante pelo menos três séculos, desde a preparação do terreno natural para as primeiras construções, até a deposição da camada recente de asfalto que cobria a via. No Brasil a aplicação dessa metodologia em áreas urbanas vem se mostrado positiva para o entendimento de sítios de cidades densamente ocupadas, que apresentam frequentes modificações no espaço (Garcia et al., 2020; Narciso, 2016).

ESTRATIGRAFIA NO CONTEXTO DO ARMAZÉM

A partir da investigação de subsolo foram identificados 11 remanescentes arquitetônicos, entre eles alicerces e a estrutura circular. Com a sobreposição do levantamento topográfico4 dos remanescentes, com uma ortofotografia do Google e a carta de Gotto (1871), percebeu-se que o espaço pesquisado corresponde aos fundos do imóvel de número 221, anteriormente descrito (Figura 2). A ausência de remanescentes das demais partes do prédio está relacionada com cortes e instalações de infraestruturas modernas que ocorreram ao longo do século XX, como manilhas cerâmicas e de concreto para esgoto e redes elétricas, de telecomunicações e dutos de polietileno flexível para gás, envelopadas por concreto, além do próprio recorte da área de pesquisa que se restringiu ao leito da Avenida Marechal Floriano. No processo de evidenciação dos remanescentes foram coletados diversos materiais móveis, como fragmentos de faiança portuguesa, faiança fina inglesa, porcelana chinesa, cerâmica, metal, vidro e ossos de fauna. Todavia, as unidades de escavação não apresentaram quaisquer vestígios das valas abertas durante as edificações no endereço estudado. Característica observada na maior parte dos lotes investigados ao longo da avenida e que sugere que o próprio depósito autóctone foi utilizado como preenchimento dos cortes abertos para a construção dos alicerces, dificultando a identificação do contato entre o sedimento natural e o alterado pela atividade.

A estratigrafia nessa área é representada predominantemente por uma extensa camada de sedimentos remobilizados durante a derrubada do casario na primeira década do século XX. É caracterizada por sedimento areno-argiloso, compactado, de cor marrom acinzentada (10YR 4/2 - Munsell), que se estende pela Avenida Marechal Floriano cobrindo a maior parte dos remanescentes arquitetônicos. Estava coberta por uma camada de concreto associada ao modal dos bondes elétricos e por outra camada de concreto usada como contrapiso do asfalto que cobria a via. Abaixo da camada de sedimentos remobilizados estava o solo natural, de granulometria areia fina e coloração bege (10 YR 7/4 - Munsell), semelhante a depósitos encontrados em ambientes de restinga.

Todos os alicerces identificados foram construídos com blocos de gnaisse fixados com argamassas feitas de argila, areia e fragmentos de conchas moídas, cujas cores variaram em função dos percentuais dos compostos utilizados, sugerindo a existência de arranjos construídos em momentos distintos. O alicerce mais robusto, funcionou como base da parede que fez divisa com o prédio 219 e, provavelmente, foi implementado nesse espaço durante a construção do prédio vizinho, pois é o único que possui argamassa de coloração marrom alaranjada.

Nos fundos do terreno destaca-se o conjunto de alicerces que formam um ambiente com dimensão interna de 5,9 x 2,7 m, composto por remanescentes menos sólidos, assentados com argamassa de um só tipo. O arranjo espacial e o mesmo tipo de argamassa sugerem que eram componentes de um mesmo projeto. Nos cantos Sudoeste e Sudeste desse quadrante foram identificados dois conjuntos de blocos de rocha, que podem estar relacionados à remobilização do material que compunha os alicerces em decorrência de atividades de reforma e passagens de infraestruturas (Figura 3).

No centro do quintal é destaque a estrutura circular, construída sem argamassa, com blocos irregulares de rocha e fragmentos de tijolos maciços e de telhas. Seu topo é marcado pela presença numericamente superior de fragmentos de telhas e tijolos. Dentro do orifício central foram encontradas duas camadas, as quais são exclusivas nesse sítio.

Figura 2: a) Destaque para os remanescentes arquitetônicos do prédio 221 da Rua dos Ourives e para as quadrículas escavadas. b) Sobreposição entre a carta de Gotto (1871), uma ortofotografia do Google e a topografia dos remanescentes. Em azul tem-se as porções edificadas do prédio, em verde seus fundos e em cinza as estruturas identificadas em campo. As linhas brancas na imagem aberta sinalizam os limites da atual Avenida Marechal Floriano.
Figura 2: a) Destaque para os remanescentes arquitetônicos do prédio 221 da Rua dos Ourives e para as quadrículas escavadas. b) Sobreposição entre a carta de Gotto (1871), uma ortofotografia do Google e a topografia dos remanescentes

A superior é composta por sedimento areno-argiloso, compactado, de coloração cinza escura (10 YR 3/1 - Munsell) e apresentou 13 fragmentos de faiança (três ingleses e dez portugueses), 21 fragmentos de cerâmica (seis de produção local e 15 em torno) e seis fragmentos ósseos, sendo cinco bovinos (falange e costela), e um osso de ave. Abaixo desta camada e cobrindo o depósito natural, foi identificado um sedimento arenoso fino, com compactação moderada e de cor branca (10 YR 2/2 - Munsell), contendo apenas um fragmento de vidro translúcido, de morfologia prismática, apresentando processo de iridescência e textura áspera, mas muito semelhante a um cristal de quartzo hialino (Figura 4).

Figura 3. a) Canto Sudeste. Sinalizado em verde a reforma estrutural e em azul os blocos de rocha soltos. b) Canto Sudoeste. Sinalizado em verde os cortes identificados nos alicerces e em azul os blocos de rocha soltos.
Figura 3. a) Canto Sudeste. Sinalizado em verde a reforma estrutural e em azul os blocos de rocha soltos. b) Canto Sudoeste. Sinalizado em verde os cortes identificados nos alicerces e em azul os blocos de rocha soltos
Figura 4. a) Remanescente arquitetônico circular. No fundo do seu interior nota-se a camada arenosa branca. b) Fragmento de cerâmica confeccionada em torno, decorada com pintura vermelha e elementos desenhados em branco. c) Fragmento de vidro translúcido de morfologia prismática.
Figura 4. a) Remanescente arquitetônico circular. No fundo do seu interior nota-se a camada arenosa branca. b) Fragmento de cerâmica confeccionada em torno, decorada com pintura vermelha e elementos desenhados em branco. c) Fragmento de vidro translúcido de morfologia prismática

Devido às características dos remanescentes trabalha-se com a hipótese de três momentos construtivos: o primeiro representado pelo alicerce robusto, com edificação associada ao prédio vizinho 219; o segundo, composto pelos remanescentes que formam o quadrante nos fundos do terreno; e o terceiro, representado pela estrutura circular.

Cabe destacar que a remobilização do solo decorrente da implantação de diversas infraestruturas urbanas não deixou vestígios do armazém propriamente dito, impossibilitando a comparação com os demais remanescentes desse lote, assim como a sucessão cronológica entre a estrutura circular e os alicerces dos fundos. Ainda assim, sabe-se que o conjunto de alicerces dos fundos é posterior ao robusto, pois há uma nítida reforma nesse último feita com o mesmo tipo de argamassa avermelhada utilizado no conjunto. Considera-se que pode ser derivada dessa ação a origem dos blocos soltos juntos ao vértice Sudeste, assim como os blocos identificados no canto Sudoeste parecem ter relação a um corte que atingiu dois daqueles alicerces para a passagem de um cano de chumbo.

O CÁRCERE DO ARMAZÉM

Conforme Gotto (1871) e o Jornal do Brasil (1904c), esse prédio possuía quintal, espaço que a sobreposição cartográfica demonstra como sendo a área escavada. A presença do alicerce robusto também indica que a área investigada correspondia aos fundos do imóvel 221, pois difere dos demais quanto a suas proporções e tipo de argamassa. Muito provavelmente, tenha sido construído durante as obras do prédio 219 e, de modo acessório, teria funcionado como um muro compartilhado com o terreno do prédio 221.

Na carta de Gotto (1871) o quintal não consta como espaço edificado, o que abre precedente para pensar que a área ainda não havia sido construída e, portanto, seria posterior ao uso do prédio como armazém de pessoas escravizadas. Porém, a realização dessa carta está ligada ao projeto da Companhia Rio de Janeiro City Improvements de instalação de redes de coleta de esgoto e de abastecimento de água, indicadas através de linhas vermelhas. Sendo esse um dos principais objetivos da representação, entende-se que as edificações detalhadas seriam aquelas relacionadas diretamente ao projeto, de modo que estruturas menos sólidas, arquitetonicamente definidas como temporárias, não necessitariam de representações e sua eventual supressão teria alinhamento com o objetivo da obra.

Exposto o contexto em que a carta foi produzida, trabalha-se com a hipótese de que o conjunto de alicerces do fundo do terreno já existiria na década de 1870 e teria sido utilizado durante o período de funcionamento do Armazém M. Velludo & C. Essa interpretação é corroborada pela presença de objetos identificados no canto Sudoeste dos alicerces dos fundos, entre eles um vasilhame de faiança fina em boas condições de preservação, cujo período de produção oscila entre 1818 e 18405. A partir da posição dessa construção nos fundos do terreno e dos materiais identificados, considera-se que o local tenha funcionado nas décadas de 1860 e 1870 como uma espécie de cárcere, onde as pessoas escravizadas a serem vendidas pelo Armazém M. Velludo & C. teriam ficado aprisionadas quando não estavam em exposição para os compradores. Como evidência material conexa ao uso desse espaço como cárcere, destaca-se uma bola de ferro de 5 kg encontrada junto à porção externa desse quadrante. O objeto apresenta uma área assimétrica, que o distingue dos projéteis utilizados em canhões, e provavelmente corresponde a uma porção onde estaria fixada uma corrente que era presa nas pernas dos cativos durante as punições.

Armazéns escravistas foram ilustrados por diferentes artistas no Brasil do século XIX, frequentemente, representados como espaços amplos em térreos, assim como parece ter sido o térreo do prédio 221, considerando-se que após o comércio de pessoas, o mesmo foi usado como depósito de maquinas.

Pensando a partir do contexto em que o Armazém M. Velludo & C. estava inserido, entende-se que locais como esse em centros urbanos seriam espaços públicos, isso é, locais utilizados como ambientes de recepção de compradores e de avaliação das pessoas negociadas. Neste sentido não é lógico pensar, dentro do sistema econômico escravista e capitalista, que os cativos comercializados ficariam longos períodos sem vigília e próximos da saída do armazém estando este em uma das áreas mais povoadas do Rio de Janeiro no fim do século XIX.

Esse aspecto é corroborado por Lalouf et al. (2008) quando falam sobre um prédio que teve uso similar em São Luís do Maranhão, frisando a existência de apenas uma porta de acesso para a área externa e de janelas construídas sob a forma de agulhas. Essas características estariam alinhadas com a primeira das funcionalidades atribuídas pelos autores aos lugares de comércio de pessoas escravizadas: assegurar que contratos comerciais fossem cumpridos, impor controle e limitar as possibilidades de fugas.

Armazéns eram locais intermediários na perversa cadeia de comércio de seres humanos, porém, além dos cativos que compunham a “mercadoria”, esses estabelecimentos contavam também com mão de obra fixa, seja cozinheiros, feitores, capatazes ou caixeiros, como Justo Gonçalves Pereira, que foi agredido no motim de 1872 e depois passou a trabalhar em um outro armazém (Diário de Noticias, 1872; Jornal do Commercio, 1872). Ao descrever um dos armazéns do mercado do Valongo, Debret (1835) menciona a presença de uma cozinha e de “escravos domésticos” naquele local, e relata que as pessoas a serem vendidas dormiam no sótão representado em grades azuis (Figura 5).

Figura 5. a) Mercado de escravos na Rua do Valongo - Aquarela sobre papel - 17,5 x 26,2 cm. Jean-Baptiste Debret (1816-1828).
Figura 5. a) Mercado de escravos na Rua do Valongo - Aquarela sobre papel - 17,5 x 26,2 cm. Jean-Baptiste Debret (1816-1828)

Todavia, a estrutura de funcionamento do armazém da Rua dos Ourives parece ligeiramente diferente. Como pontuado nos periódicos históricos, episódios de fugas ligados a esse armazém foram frequentes ao longo de seu período de uso. Por esse motivo, dificilmente as pessoas a serem vendidas ficariam em um espaço com acesso direto ao Largo de Santa Rita, local que era ponto de encontro de africanos e seus descendentes (Figura 6). No chafariz, além da coleta de água certamente eram rememoradas religiosidades e ao mesmo tempo intercambiados valores culturais, tal como considerou Andrade Lima (2016) para outro ponto d’água do centro da cidade. Destaca-se que no Largo de Santa Rita, entre 1722 e 1774, funcionou o primeiro cemitério de pretos novos da cidade do Rio de Janeiro. O Largo de Santa Rita certamente seria, e ainda é, um lugar de memória, de conexão com ancestralidades africanas (Andrade et al., 2020; Nara Júnior, 2016, 2019; Nora, 1993).

A preocupação que deveria existir com o controle e a manutenção dos cativos afastados da porta da rua ganha ainda mais peso quando se amplia o ângulo de visão para a paisagem urbana onde estava inserido o Armazém M. Velludo & C. Ao fazer esse exercício, percebeu-se que o Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial do Rio de Janeiro (Haring, 1860, 1865, 1868, 1870; Laemmert, 1872, 1873) trazia em suas páginas uma série de estabelecimentos de mesma natureza orbitando o Largo de Santa Rita, contemporâneos ao armazém em estudo. Portanto, é plausível pensar que os mercadores e administradores evitariam ao máximo a interação entre cativos de diferentes armazéns (Figura 7).

Figura 6. a) Largo com chafariz - Aquarela sobre papel - 25,7 x 36,4 cm. Eduard Hildebrandt (1844). b) Church of Santa Rita (Ewbank, 1856, p. 312).
Figura 6. a) Largo com chafariz - Aquarela sobre papel - 25,7 x 36,4 cm. Eduard Hildebrandt (1844). b) Church of Santa Rita (Ewbank, 1856, p. 312)
Figura 7. Localização dos armazéns que comercializavam pessoas no perímetro do Largo de Santa Rita em período contemporâneo ao de José Moreira Velludo. Na carta de Gotto (1871) estão destacadas em azul as porções edificadas e em verde os fundos. As linhas vermelhas correspondem às representações das redes previstas no projeto.
Figura 7. Localização dos armazéns que comercializavam pessoas no perímetro do Largo de Santa Rita em período contemporâneo ao de José Moreira Velludo

Formas semelhantes de planejamentos arquiteturais e paisagísticos, pensadas para maximizar o controle de pessoas escravizadas, foram identificadas também em outras estruturas do sistema escravista brasileiro, mas relacionadas com unidades rurais. São exemplos um engenho em Goiás, onde a senzala foi construída defronte à sede e as unidades produtivas integradas à residência (Souza, 2007); uma charqueada no Rio Grande do Sul, com a senzala e as unidades de produção próximas entre si, distantes da sede, mas com a casa do capataz colada com a senzala (Sampeck e Ferreira, 2020); e uma fazenda de café no Rio de Janeiro, com sede em posição destacada no quadrilátero funcional a fim de garantir alta visibilidade da senzala, enfermaria, terreiro e área de processamento do café (Andrade Lima, 2011).

Como já exposto, no armazém estudado, o térreo possivelmente foi um espaço público de exposição e venda das pessoas escravizadas e, talvez, um posto de controle sobre o cárcere edificado nos fundos do terreno, um espaço privado onde a circulação de terceiros seria restrita. Nesse sistema arquitetônico não havia uma unidade produtiva, pois o capital provinha da comercialização das próprias pessoas. Desse modo, a clausura de cativos no anexo aos fundos do prédio seria pertinente à lógica do sistema local, tornando mais difícil o acesso à porção externa do prédio enquanto estivessem longe dos olhos dos mercadores.

Além disso, as dimensões do anexo de fundos, de 5,9 x 2,7 m, indicam que a área pode facilmente ter sido utilizada como cárcere para cerca de 30 pessoas, número tomado como referência a partir da quantidade máxima de pessoas anunciadas em um só dia nos periódicos. A referência a 29 escravizados detidos em 1872, enquanto apenas sete foram julgados meses depois, também fornece uma ideia do número de indivíduos que girava nesse espaço. Parece plausível considerar que todas as pessoas presentes naquele espaço teriam sido presas na situação e só depois teria sido realizada a averiguação de quais eram as que de fato estavam envolvidas com o motim.

Outro indicador que reforça à hipótese da construção anexa ao prédio como local ocupado por pessoas escravizadas entre as décadas de 1860 e 1870, é a presença de objetos relacionados a cultos de matriz africana. No canto Sudoeste dos fundos do terreno foram recuperados materiais arqueológicos móveis em quantidade, diversidade, organização e índice de fragmentação, não observados em outras quadrículas do sítio. A organização espacial e a posição de alguns sugerem que teriam sido colocados de maneira intencional naquele espaço. A deposição singular dos materiais no interior da estrutura assemelha-se com assentamentos dedicados a divindades e ancestralidades de origem africana (Gordenstein, 2019; Kileuy e Oxaguiã, 2009).

MATERIAIS SAGRADOS

Entre os materiais recuperados no canto Sudoeste consta um recipiente de faiança fina emborcado entre fragmentos de telhas que foram depositados abaixo e cobrindo-o, além da presença de argila alaranjada e cal ao redor. Esse recipiente foi concebido como um urinol, porém materiais como esse são bastante similares a terrinas – potes utilizados em contextos domésticos para conter alimentos com caldo – que de forma geral diferenciam-se dos urinóis por apresentarem duas alças. Associados ao pote estavam também objetos metálicos como uma colher de bronze, uma fivela de liga metálica e escórias de metal; objetos de vidro como um pequeno frasco de perfume, fragmentos de uma garrafa e fundos de copos; e ossos de animais, com predomínio de bovídeos, um osso de ave e outro de um mamífero de família não identificada. Foi recuperado também um pequeno pote de 7,5 cm de diâmetro feito de cerâmica torneada, contendo em seu interior fragmentos de carvões e cal (Figura 8).

Uma das autoras, Deusimar de Lissá, propõe que o conjunto de materiais identificado no canto Sudoeste do anexo possa ter sido parte de um assentamento. Ressalta a pertinência da presença de ossos de boi; o recipiente de faiança fina como uma espécie de receptáculo; e o pequeno pote cerâmico que poderia ter sido um alguidar, semelhante aos atualmente dedicados a Ogum e Exu.

Figura 8. Recipientes identificados no canto Sudoeste aos fundos do cárcere. a) Objeto de faiança fina com cena britânica decorado por técnica transfer printing e acabado com esmalte Pearlware; b) Objeto cerâmico com marcas de produção em torno.
Figura 8. Recipientes identificados no canto Sudoeste aos fundos do cárcere. a) Objeto de faiança fina com cena britânica decorado por técnica transfer printing e acabado com esmalte Pearlware; b) Objeto cerâmico com marcas de produção em torno.

Diante das peculiaridades dos materiais, considera-se que tenham tido relação com as pessoas escravizadas que estiveram naquele lugar. Talvez, um assentamento posto por pessoas que teriam encontrado modos de professar sua fé, movimentando o cosmos para que houvesse forças para suportar as adversidades da vida material. O tempo de permanência da maior parte das pessoas sob a condição de escravas nesses lugares era relativamente curto em contraste, por exemplo, com o tempo daquelas que estavam em unidades rurais, que em muitos casos eram o destino final no sistema escravista. Apesar disso, assentamentos ligados à fé parecem ter sido implementados mesmo assim, talvez por pessoas que tenham permanecido no armazém por um período maior.

No que se refere a estrutura circular, especialmente em decorrência de sua forma e posição no centro do quintal, inicialmente considerouse que seria um poço para captação de água, pois parecia a explicação mais lógica para uma estrutura circular construída com blocos de rocha. Contudo, percebeu-se que a morfologia interna tendia a coniforme, com a abertura interna mais larga na base do que no topo, e a porção externa semelhante à de domos vulcânicos, ou seja, diferindo da forma geral de poços utilizados no Brasil, assim como o identificado por Andrade Lima (2016) no centro do Rio de Janeiro, com uso cronologicamente atribuído ao século XVIII. Cabe colocar ainda que a base dessa estrutura foi construída sobre o topo da camada de sedimentos aluviais natural, característica entendida como limitante se a finalidade dessa estrutura fosse captar água do lençol freático.

Dadas as limitações técnicas, outras linhas de interpretação a respeito desse remanescente começaram a ser tecidas. Em um segundo momento, considerou-se que a estrutura circular pudesse estar relacionada a alguma construção para aplicação de castigo no armazém, erigida para punir cativos capturados após fuga ou outras infrações. Os blocos de rocha poderiam compor um tipo de base para a fixação de picota (tronco ou pelourinho), semelhante a ilustrada por Debret no início do século XIX (Figura 9). Todavia, a circunferência interna da estrutura arqueológica é de 1 m, aparentemente maior do que o ilustrado nessa e em outras representações de estruturas de castigo da mesma época. Ainda relacionado às estruturas de punição, embora não se tenha encontrado paralelos de comparação, também foi considerada a possibilidade que ela pudesse ter sido construída como uma espécie de ergástulo ou solitária, uma vez que o diâmetro de seu interior poderia comportar uma pessoa agachada.

Um quarto viés interpretativo é trazido também por Deusimar de Lissá comparando algumas das características arquitetônicas da estrutura arqueológica com assentamentos dedicados ao vodum Ayizan, originário da região do Golfo da Guiné ocupada por povos Gbè-falantes, como os Adja, Gen, Ewe e Fon (Da Silva, 2019; Matory, 1999; Parés, 2018). No Brasil o culto aos voduns está relacionado a povos de origem Ewe-Fon, pouco numerosos no Rio de Janeiro onde a maioria dos capturados vieram da África central e austral, de tronco linguístico Banto, mas frequente na Bahia onde adeptos desses cultos mais tarde tiveram grande influência na formação do Candomblé (Eltis, Richardson, Behrendt, Klein, 2000; Parés, 2018; Reis, 1996). Todavia, existem relatos de culto aos voduns no Rio de Janeiro que recuam pelo menos até 1864, quando uma mulher vinda do antigo reino de Daomé (Benin) chamada Rosena teria dado início a essas práticas no bairro da Saúde (Conduru, 2010; Netto, 2013; Silveira, 2012). Outro dado a ser considerado é a constatação de que muitos dos cativos chegados entre as décadas de 1860 e 1870 vieram da Bahia e de outros estados ao Norte do Rio de Janeiro (Jornal do Commercio, 1863a; O Movimento,1872).

Figura 9. Castigo de escravo que se pratica nas praças públicas – Aquarela sobre papel – 16,3 x 22,1 cm. JeanBaptiste Debret (1826).
Figura 9. Castigo de escravo que se pratica nas praças públicas – Aquarela sobre papel – 16,3 x 22,1 cm. JeanBaptiste Debret (1826)

Ayizan na cosmologia Ewe-Fon é um vodum feminino que significa “a esteira da terra” ou “superfície do planeta”, que nas roças brasileiras desse culto pode ser representada por um montículo com porções externas revestidas por blocos de rocha e interior preenchido com terra, onde são colocados também materiais representativos de diferentes energias, como metais e partes de animais oferecidas em sacrifício. Verger (1999) ao tratar sobre a liturgia construtiva dos assentamentos de Ayizan acrescenta que neles eram utilizadas terras e areias de diferentes lugares, assim como folhas, dendê e amuletos (Figura 10).

O assentamento de Ayizan trazido como exemplo assemelha-se com a estrutura arqueológica por ambos possuírem porções externas edificadas com blocos de rocha sem aglutinantes e morfologia de domo, com a circunferência de base maior que a de topo. Reforça essa hipótese a presença das camadas areno-argilosa e de areia branca, descritas anteriormente, e que foram identificadas apenas dentro da circunferência da estrutura, o que remete à menção de Verger (1999) sobre a adição de diferentes camadas de terra e areia durante o processo de implementação dos assentamentos desse vodum.

Figura 10. Assentamento de Ayizan presente na roça do Rumpaime Héviosô zôônokum Mean, município de São Gonçalo, Rio de Janeiro.
Figura 10. Assentamento de Ayizan presente na roça do Rumpaime Héviosô zôônokum Mean, município de São Gonçalo, Rio de Janeiro

Contudo, algumas características da estrutura arqueológica podem ser vistas como limitantes para essa interpretação, pois a cosmologia que explica Ayizan diz que seus assentamentos devem possuir forma monticular na superfície, já o remanescente visto nos fundos do armazém foi construído para ficar de baixo da terra e não sobre o solo, uma vez que apresenta cotas topográficas inferiores aos alicerces identificados na área. Também é difícil considerar a construção de uma estrutura assim em um local voltado para o comércio de africanos e descendentes. Manifestações materiais de fé desse porte, oriundas da África, nas dependências de um local que vendia pessoas parece improvável, todavia parte do relato de Debret (1835) a respeito de um armazém que comercializava pretos novos no Rio de Janeiro, na Rua do Valongo, deixa espaço para a consideração dessa hipótese:

Essa sala de venda, comumente silenciosa, está sempre infectada pelo miasma de óleo de rícino que exala dos poros enrugados desses esqueletos ambulantes, cujo olhar curioso, tímido, ou triste, lembra o interior de uma coleção de feras. Esse mercado, algumas vezes, entretanto, convertido em salão de baile, pela permissão do patrão, agora retumba os urros cadenciados de uma fila de negros girando sobre si próprios e batendo palmas para marcar o compasso; tipo de dança muito semelhante àquela dos índios do Brasil6 (Debret, 1835, p. 78).

Nessa passagem o artista comenta que com permissão do responsável em algumas situações o lugar de vendas era convertido em uma sala de baile, onde pessoas dispostas em fila entoavam cânticos, batiam palmas e giravam sobre si próprios. Lendo essa descrição hoje, percebe-se que por falta de uma expressão mais adequada Debret (1835) denominou como “baile” o que parece a descrição de uma dança ritual acontecendo em um armazém que vendia seres humanos. Essa ponderação, incita o pensamento de que materiais sagrados implementados abaixo do chão, dentro das dependências do armazém de José Moreira Velludo, possam ter alicerçado as ações das pessoas que lá estavam, interagindo com elas no exercício cotidiano de reunir forças para encarar as dificuldades da vida no Rio de Janeiro.

Essa reflexão parte da ideia de que a cultura material é ativa – desenvolvida por iniciativas ideologicamente fundamentadas e materializadas a partir da modificação da natureza – relacionando-se com os atores e mediando suas relações sociais (Hodder, 1982) e que os objetos possuem agência e sentido próprios a partir do momento em que são projetados e postos em cena (Latour, 1996). Wobst (2000) explica que essa percepção na Arqueologia proporcionou que uma maior sensibilidade fosse adotada, possibilitando o tratamento de contradições, disjunções e interesses conflitantes, permitindo pensar as pessoas como variáveis e também os fatores que lhes consentem ou restringem ação; e os objetos como pontos de referências intimamente ligados às atitudes das pessoas. O autor opta por designar os objetos como “interferências materiais” ou “intenções materiais para mudança”, entendendo-os como suportes capazes de exercer ou evitar mudanças, podendo alicerçar, constituir, instigar e conter as pessoas.

Pensando a partir de materiais sagrados, Gell (1998) parte do princípio de que as coisas possuem agência argumentando que objetos rituais motivam determinadas condutas das pessoas, como por exemplo a oferta de alimentos a ídolos. Hoskins (2006) ainda discute que essa faculdade não se restringe às pessoas e frisa que as coisas podem agir sobre o mundo e pessoas, causando mudanças, por meio de uma agência dada por seus idealizadores. Walker e Lucero (2000) falam que materiais arqueológicos móveis e de grande porte, como os arquiteturais, iniciam como matéria-prima, passando por diferentes estágios durante seus ciclos de vida, podendo ser usados e reutilizados conforme necessidades infindas, não devendo-se pensar as funções dos objetos como estáticas, citando como exemplo panelas aparentemente utilitárias que podem ser retiradas de contextos domésticos e ressignificadas em contextos cerimoniais.

A partir dessas referências pode-se pensar o caso do armazém estudado no centro do Rio de Janeiro. No cárcere foi encontrado um urinol, um objeto idealizado na Europa para suportar fezes e urina, mas que ao sair da fábrica pode ter tido usos diversos até ser ressignificado como parte integrante de um ritual, passando em conjunto com os outros objetos a mediar as ações das pessoas cientes de sua presença ali. Assim, também, o fragmento prismático de vidro, que talvez por assemelhar-se a um cristal de quartzo tenha ganhado a notoriedade de ser o único o objeto presente na camada de areia no interior da estrutura circular, seja ela de fato um assentamento de Ayizan ou uma estrutura distinta, como se sugeriu nas demais hipóteses, e ressignificada por indivíduos de diferentes origens. Como colocado por Verger (1999), amuletos estariam entre os objetos componentes dos assentamentos Ayizan de origem EweFon, mas também se sabe que na cosmologia BaKongo cristais de quartzo são explicados como objetos que permitem a visão do “outro mundo” (Andrade Lima et al., 2014).

De certo modo os demais materiais que estavam nesses dois contextos também tiverem ciclos semelhantes, retirados de ambientes domésticos e introduzidos em novos espaços potencialmente cerimonias, comunicando que ressignificar o mundo material é um gesto de sobrevivência física e psíquica. Rodrigues (2011) abraça essa interpretação ao falar sobre a reorganização religiosa que ocorreu no Brasil em torno de signos identitários, definindo-a como um ato expressivo de resistência frente às rupturas oriundas da captura e transposição para o outro lado do Atlântico de africanos de diferentes origens.

Esse pensamento tem afinidade com a proposta de Ingold (2012) de que se pense os materiais através de fluxos entrelaçados, onde pessoas e coisas circulam em rede, e que seus processos vitais possuem caracteres fluidos, com limites sustentados por fluxos de materiais onde coisas vazam enquanto os caminhos são traçados. Partindo dessa perspectiva Muniz (2019) discute que novas configurações identitárias surgem em contextos de resistência e miscigenação, através de uma trama de relações entre pessoas e coisas em seu processo de mobilidade. Essas reflexões parecem válidas também para pensar o contexto estudado, um espaço onde a necessidade de ressignificar materiais para mediar comunicações com o sagrado seria ainda maior do que em outras estruturas do sistema escravista, pois tratava-se de um local intermediário, onde a maior parte dos cativos ficava por pouco tempo e que o acesso a ambientes externos seria restrito frente aos frequentes episódios de fuga.

CONCLUSÕES

Ao longo dessa pesquisa buscou-se demonstrar a peculiaridade do contexto arqueológico representado pelos fundos do antigo prédio 221 da Rua dos Ourives, através de análises de objetos, documentos históricos e relações estratigráficas. O conjunto de dados reunidos nessa composição traz à tona uma parcela importante da materialidade de cativos urbanos, destacando-se as concentrações de objetos pensadas como assentamentos afro-religiosos. Nesse exercício, as semelhanças entre a área estudada e paralelos etnográficos, juntamente com a especificidade do relato de uso de um armazém do Valongo, parecem validar a interpretação da existência de contextos rituais mesmo em um espaço marcado por intenso controle. Nesse caso, um local intermediário do sistema escravista, mas que continha objetos que remetem a assentamentos, com os quais as pessoas vinculadas ao prédio 221 da Rua dos Ourives, fixos ou apenas de passagem, parecem ter interagido, sustentando raízes culturais e desafiando a ordem social dominante.

Quanto à estrutura circular, foram levantadas quatro hipóteses para a sua construção, as quais tiveram pontos positivos e negativos para sua validação. Ainda assim, a concentração e posicionamento estratigráfico dos objetos em seu interior remetem a um simbolismo notável para com essa estrutura. A partir do momento que se identifica afinidades com ritos, os materiais estudados indicam ainda que sítios históricos podem ter paralelos com cultos de largas profundidades, e que diferentes circunstâncias ao longo dos tempos podem levar a adequações e ressignificações para manutenção das manifestações de fé.

NOTAS

1. Pesquisa desenvolvida pela Artefato Arqueologia e Patrimônio em âmbito do Programa de Gestão do Patrimônio Arqueológico e Histórico da Área de Implantação do Veículo Leve Sobre Trilhos - VLT e Respectivas Paradas Para Acesso de Passageiros - Trecho L900 - Centro, Rio de Janeiro/RJ.

2. A Igreja de Santa Rita e o Cemitério de Pretos Novos de Santa Rita, que funcionou no largo durante o século XVIII, são também espaços importantes da diáspora africana no Rio de Janeiro (Andrade, Vitalino, Crespo, Bianchini, Gaspar, 2020; Nara Jr. 2016, 2020).

3. Nesse ponto é importante destacar que quando é escrito “vindos do norte”, essa origem aproximada pode abarcar não só estados do Norte do Brasil como também do Nordeste, pois o início da divisão do país em unidades político-administrativa se deu apenas 1969 (Pimenta, 2007).

4. Levantamento topográfico realizado por José Carlos Puttini, Mru-control Serviços de Medição Limitada.

5. A estimativa do período de produção foi feita a partir do levantamento de Soares (2011), onde o ano de 1818 é apresentado com início do uso da cor marrom em faiança fina e 1840 como o ano em que cessou a produção de Pearlware com cenas britânicas.

6. Tradução realizada por Bandeira e Lago (2009) a partir do texto original escrito em francês por Debret (1835).

AGRADECIMENTOS

Agradecemos a Francyla Bousquet por suas observações sobre estruturas arquitetônicas temporárias e sobre o contexto em que foi produzida a carta de Gotto (1871). Também agrademos a Lúcio Menezes Ferreira pelo convite para compor esse volume sobre Arqueologia da Diáspora Africana na América do Sul.

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